Eng. Agr. MSc Harri Lorenzi
Jardim Botânico Plantarum
Plantas nativas – são as plantas que ocorrem naturalmente em determinado território onde evoluíram durante milênios e estão em equilíbrio dinâmico com a fauna local. Podem ser endêmicas de uma região restrita ou podem ter naturalmente uma larga área de ocorrência como um estado inteiro, região e mesmo um país inteiro ou mais de um país. Uma planta nativa só pode ser considerada como tal apenas dentro de sua região de ocorrência natural. Por exemplo, uma planta de ocorrência natural apenas na região Amazônica não pode ser considerada nativa em outra região.
Plantas nativas não podem ser cultivadas em populações homogêneas (mono específicas) em escala comercial por muito tempo. Os únicos casos no país de ocorrência de populações homogêneas naturais densas são da espécie Araucaria angustifolia (pinheiro-do-paraná) e de umas poucas espécies de palmeiras (Arecaceae) e gramíneas (Poaceae). É por esta razão que não existem cultivos em escala comercial de espécies industriais, alimentícias e florestais nativas no país; as tentativas realizadas até hoje resultaram em desequilíbrio e grandes perdas por ataque de pragas e doenças. Um caso bem conhecido deste problema é o cultivo comercial de duas espécies de maracujás nativas (Passiflora edulis e Passiflora alata) para produção de frutos e para fins ornamentais; devido à grande ocorrência de problemas fitossanitários em cultivo, principalmente de origem virótica, não é possível mantê-las vigorosas e produtivas por muito mais de um ano, apesar de serem espécies perenes.
Plantas exóticas – são as espécies introduzidas em uma região onde não ocorrem em estado nativo, tornando-se casuais, naturalizadas ou invasoras. A grande maioria das espécies cultivadas no país para fins alimentícios, industriais e madeireiros são oriundas de outros países e não têm substitutos equivalentes na flora brasileira.
Há espécies exóticas, denominadas de ‘casuais’, que ao chegarem a uma nova região conseguem se tornar reprodutivas (sexual ou vegetativamente) e eventualmente produzir descendentes. Entretanto, várias delas não mantêm uma população viável no novo ambiente sem a intervenção humana direta e, se não forem ativamente cultivadas, acabam por extinguir-se do local de introdução; outras, chamadas ‘exóticas naturalizadas’, estabelecem populações localmente persistentes, mas que, devido às limitações na dispersão ou na competência ecológica, ficam restritas a áreas próximas do local de introdução, sem ocupar novas áreas; quando conseguem dispersar-se para áreas distantes do local de introdução e lá estabelecer-se, transformam-se em ‘invasoras’.
Plantas invasoras – são as que possuem propágulos sexuados dotados de formas e composições que favorecem a sua dispersão por agentes do meio (vento, água e animais) e, sem encontrar inimigos naturais, se estabelecem espontaneamente na natureza. Como o próprio nome indica, são plantas que ‘invadem’ outras áreas através de seus dispersores. O Brasil tem poucos registros da transformação de uma espécie introduzida em ‘planta invasora’. São bem conhecidos os casos dos pinos (principalmente da espécie Pinus elliotti), uma essência florestal que escapou do cultivo e invadiu áreas naturais campestres no Planalto Meridional, do capim-braquiária (principalmente da espécie Urochloa decumbens), uma forrageira para pastagem que escapou do cultivo e invadiu áreas de vegetação aberta do cerrado e áreas antropizadas, da Leucaena leucocephala, introduzida como forrageira que escapou do cultivo e invadiu áreas antropizadas (ruderais) principalmente nas regiões Sudeste e Centro-oeste e das casuarinas (três espécies) que, introduzidas para fixação de dunas litorâneas, tornou-se invasora de restingas. Entretanto, o problema com plantas invasoras é particularmente grave em alguns países, como a Austrália, Estados Unidos e em diversas ilhas do arquipélago dos Açores, os quais tive o privilégio de acompanhar e estudar; as plantas não só invadiram o território, mas substituíram as plantas existentes e impediram o crescimento de outras, tornando-se homogêneas. Curiosamente, muitas das espécies invasoras nesses locais foram introduzidas do Brasil. Nessas regiões, essas plantas encontraram condições favoráveis de desenvolvimento e, devido à ausência de inimigos naturais, proliferaram de forma descontrolada.
Como estudioso das plantas daninhas e invasoras há mais de 50 anos e tendo escrito todos os livros sobre o tema publicados no país durante este período, não tenho registros de ocorrência de plantas introduzidas com fins ornamentais que se transformaram em sérios casos de ‘plantas invasoras’ numa grande área, apesar de muitas delas já estarem por aqui há mais de um século. Há casos pontuais, contudo, que devem ser ressaltados: Cryptostegia grandiflora, introduzida das Ilhas Mascarenhas e Maurício nas regiões tropicais do Brasil, transformou-se em ‘planta invasora’ em algumas áreas do bioma Caatinga; Hedychium coronarium, introduzida da Ásia, transformou-se em ‘planta invasora’ na região litorânea em áreas paludosas antropizadas; Thunbergia alata, introduzida da África, transformou-se em ‘planta invasora’ em áreas antropizadas da região litorânea; Lonicera japonica, introduzida do Japão, transformou-se em ‘planta invasora’ de média dispersão no Planalto Meridional. Schlefflera actinophylla, introduzida da Austrália, transformou-se em ‘planta invasora’ de pequena dispersão principalmente em regiões tropicais úmidas; Pistia stratiotes e Eichhornia crassipes, introduzidas da região amazônica no Sudeste e Centro-oeste, transformou-se em séria ‘planta invasora’ em mananciais aquáticos (lagos e represas). Por outro lado, o açaí-do-pará (Euterpe oleracea), uma espécie nativa da região do Baixo Amazonas quando cultivado próximo de fragmentos de vegetação do Bioma Mata Atlântica na zona litorânea se hibridiza com o palmito-juçara (Euterpe edulis), causando erosão genética nesta espécie.
Plantas daninhas – são as que crescem espontaneamente em lavouras agrícolas introduzidas pelo homem através de sementes contaminadas, podendo ou não serem invasoras.
Espécie ruderal – são as que ocorrem em ambientes altamente perturbados pela ação humana, podendo ser tanto espécies nativas quanto exóticas. Um terreno abandonado, um local de descarte de entulhos ou uma área desmatada podem todos ser ocupados por uma comunidade de espécies ‘ruderais’, que eventualmente poderá iniciar o processo de sucessão ecológica. Enquanto as ‘plantas daninhas’ afetam os interesses humanos, as ruderais têm uma nuance ecológica porque são plantas resistentes aos impactos antrópicos e ocorrem em áreas degradadas.
Plantas colonialistas – são as que, uma vez estabelecidas, aumentam continuamente sua área de ocupação localmente, podendo ser considerada invasora local. Um caso típico deste tipo de planta é a espada-de-são-jorge (Dracaena trifasciata), que raramente produz propágulos sexuados no país, aumentando lenta e continuamente sua área de ocupação exclusivamente por propágulos vegetativos (rizomas), a menos que seja levada pelo homem para outras áreas; portanto, não é uma planta invasora segundo a definição acima.
Plantas pioneiras – são as que se regeneram espontaneamente logo após o corte raso de uma vegetação natural.
Obs.: as ‘plantas invasoras’ bem como as ‘plantas daninhas’ são constituídas, na sua grande maioria, por espécies introduzidas (exóticas), tanto de outros países como de outras regiões do próprio país.
O Jardim Botânico Plantarum, uma organização da sociedade civil de interesse público (OSCIP) sem fins econômicos, como renomada instituição botânica do Brasil, está coordenando um grupo semipermanente de discussão sobre o tema, envolvendo cientistas, botânicos, eng. agrônomos, eng. florestais e paisagistas de todos os biomas e regiões do país e brevemente divulgará gratuitamente para consulta pública uma cartilha ilustrada com as principais ‘espécies invasoras’ introduzidas para fins ornamentais no Brasil.