Amazônia Central - Por Terra

Expedições

Viajar até a Amazônia Central por terra é algo que nunca antes havíamos feito, apesar das dezenas de expedições botânicas já realizadas àquela região, porém sempre ao longo dos rios com chegada via aérea através de Manaus, Belém e Santarém.

Viajar até a Amazônia Central por terra é algo que nunca antes havíamos feito, apesar das dezenas de expedições botânicas já realizadas àquela região, porém sempre ao longo dos rios com chegada via aérea através de Manaus, Belém e Santarém. Desta vez pretendíamos explorar a parte oeste da Rodovia Transamazônica, á partir da Rodovia Cuiabá-Santarém até o seu final na cidade de Humaitá, no estado do Amazonas. Em outra oportunidade já havíamos percorrido a parte leste desta estrada á partir de Santarém. Nossa aventura começou na divisa dos estados de Mato Grosso e Pará, na cidade de Guarantã do Norte, onde terminava a parte pavimentada da Rodovia Cuiabá-Santarém. Após uma boa noite de sono saímos bem cedo rumo ao norte com planos de chegarmos ao entroncamento desta com a rodovia Transamazônica e no rio Tapajós, cerca de 900 km adiante, em dois dias. O péssimo estado de conservação da estrada, com muita poeira, aliada à rica diversidade vegetal ao longo da mesma, que fazia-nos parar com frequência para coleta e fotografias, nos atrasou em um dia a chegada a este destino (foto 1). De qualquer forma, nosso objetivo era coletar também ao longo do caminho, o que não nos decepcionou pelas espécies encontradas, como desta possível nova espécie de Nymphaea subaquática (foto 2). 


A cidade de Itaituba – PA, situada nas margens do rio Tapajós, foi nosso primeiro ponto de descanso, cinco dias após nossa partida de Nova Odessa – SP, sendo três dias em estrada poeirenta, em um total de 3 mil km já rodados (Foto 3). Após um dia de ‘descanso’ na cidade, fazendo contatos com os técnicos da Fundação Chico Mendes e adquirindo suprimentos para a longa jornada que nos esperava nas próximas duas semanas, partimos em um domingo de sol bem cedo para nosso segundo destino situado a apenas 50 km adiante, no Parque Nacional da Amazônia (PARNA), onde ficaríamos acampados por uma semana para explorar o que fosse possível do 1 milhão de ha do parque.
Cenário magnífico! Limitada de um lado pelo grandioso rio Tapajós, com suas belíssimas corredeiras de mais de 5 km de largura, do outro lado pela densa floresta sem fim do estado do Amazonas e, cortada por quase 100 Km pela Rodovia Transamazônica (foto 4). Sua floresta rica foi para nós uma grande experiência de coleta, pois conseguimos acessar pontos distantes até 30 Km das margens dos rios; isso geralmente não acontece quando se chega à Floresta Amazônica através dos rios, pois as dificuldades e os riscos da caminhada nunca permitem que se afaste mais do que 5-10 km das margens dos rios navegáveis. Todas as coletas botânicas feitas até hoje na floresta Amazônica, salvo raras exceções, foram efetuadas ao longo dos rios, onde a diversidade vegetal é pobre.


O acesso às áreas mais distantes do rio Tapajós permitiu a exploração de vários ecossistemas que geralmente não existem próximos dos rios e, com isso, foi possível conhecer uma flora bem mais diversificada (foto 5).
Apesar de o período ser considerado como de estiagem, a floresta estava bem verde e com muitas plantas em floração e frutificação.


As famílias arecaceae (palmeiras), passifloráceae (maracujás) (fotos 6 e 7), bem como o grupo das zingiberales foram particularmente bem estudadas e coletadas nesta expedição, revelando muitas espécies conhecidas e até algumas possivelmente ainda desconhecidas da ciência, como se sucedeu com a espécie de Syagrus ilustrada na foto 8. As Heliconiáceas, pertencentes ao grupo das Zingiberales, constituíram um capítulo a parte na rica diversidade da reserva, destacando-se uma forma diferente de Heliconia chartacea (foto 9). A maioria das plantas da família marantaceae estava estéril, contudo sua facilidade de cultivo permitiu-nos identificá-las após o seu florescimento nas coleções do Jardim Botânico Plantarum (foto 10). Foram coletadas 25 espécies de palmeiras, 20 espécies de marantaceas, 8 espécies de passiflora e 20 espécies de outras zingiberales.


Faltava agora passar pela terceira etapa da expedição, que era percorrer os 1200 Km da Rodovia Transamazônica, desde o PARNA até o seu final no estado do Amazonas, na cidade de Humaitá, situada nas margens do rio Madeira.
Esta parte da estrada, construída na década de 70, foi posteriormente tomada pela floresta e reaberta recentemente. Eram poucas informações que possuíamos sobre as condições da estrada e os pontos de abastecimento ao longo dela. Apenas dois vilarejos aparecem nos mapas oficiais ao longo de todo o trecho. Com imagens de satélite nas mãos e suprimento extra de combustível e alimentos, partimos bem cedo do nosso acampamento no Parque Nacional da Amazônia rumo ao desconhecido, inicialmente na direção sul.


No primeiro dia, com estradas esburacadas e muita poeira branca, conseguimos chegar até o primeiro vilarejo indígena de Jacareacanga, muito próximo da região noroeste do estado do Mato Grosso e distante apenas 350 Km de nosso ponto de partida. A floresta exuberante fazia-nos parar com frequência ao longo da estrada para espionar sua rica diversidade e fazer as coletas e fotografias de praxe.


Com alguns problemas mecânicos em nosso veículo devido ao excesso de poeira e sem nenhuma condição de reparo, o desconhecido tornou-se ainda mais assustador, porém tínhamos que continuar. O próximo destino era uma cidade indicada no mapa com o nome de Apuí, distante cerca de 400 Km adiante e localizada aproximadamente na metade do caminho até Humaitá. Felizmente conseguimos fazer o percurso até o início da noite e pudemos descansar para percorrer o próximo trecho no dia seguinte até Humaitá.


A região de floresta e de campinarana (tipo de savana de vegetação rala), sobre solo de areia branca e com uma flora muito diferente da floresta densa, permitiu-nos fazer ótimas coletas. Com várias malocas indígenas ao longo da estrada, fomos algumas vezes parados pelos nativos que bloqueavam a estrada e exigiam o pagamento de um pedágio. Mesmo assim conseguimos finalmente chegar, no início da noite, nas margens do grande rio Madeira, com pouquíssimo tempo para pegar a última balsa do dia que nos levaria até a outra margem, para a cidade de Humaitá. Local escuro e inóspito onde a quantidade de mosquitos e pernilongos era tamanha que, caso não conseguíssemos a balsa, teríamos que dormir dentro do veículo, sem podermos sair para o lado de fora.


Humaitá, cidade progressista e moderna, está situada a 200 Km de Porto Velho – RO com a qual tem ligação asfáltica e, a 600 Km de Manaus, à qual é ligada por uma estrada de terra totalmente intransitável e pelo rio Madeira, com intensa navegação.


Nossa última etapa da viagem era muito mais fácil: percorrer os 3200 km que separavam Humaitá de Nova Odessa – SP (nossa sede), totalmente por estrada pavimentada cortando os estados de Rondônia, Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais e São Paulo, parando frequentemente para coletar no trecho do Amazonas, de Rondônia e do Mato Grosso.

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